Esta é uma temática muitas vezes negligenciada nas inúmeras listas de afazeres de quem muda de casa: os cuidados a ter com o gato (ou gatos) envolvido num cenário de mudança de casa. Eu, consultor imobiliário, me confesso: não tenho prestado os devidos conselhos aos meus clientes sobre esta temática.

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Mas isso vai mudar de imediato! E, para tal, nada melhor do que ouvir atentamente quem se especializou nos cuidados de saúde (física e psicológica) a ter com estes animais. Assim, recorri à Dr.ª Daniela Nunes Simões, médica veterinária há 10 anos, atualmente responsável por um consultório veterinário em Matosinhos. Deixo-vos aqui uma transcrição do que foi a nossa conversa:
Marco Moura Marques (MMM): Olá, Daniela! Muito obrigado por acederes conversar comigo sobre esta temática e, acima de tudo, por me permitires partilhar a conversa com quem me segue, escuta e lê.
Daniela Nunes Simões (DNS): Olá, Marco! Obrigada pelo convite. Espero ajudar.
MMM: No Dia Mundial do Gato prestamos aqui a devida homenagem a um dos animais domésticos mais populares do Mundo.
DNS: É verdade. Os gatos ainda são dos animais mais comummente presentes nas nossas casas, seja no campo ou na cidade.
MMM: E por que motivo será isso?
DNS: Ajuda sempre voltar às origens para entender certos assuntos e de acordo com os registos existentes, os gatos foram primeiro acolhidos em lares e navios devido ao seu inegável talento para caçar pragas indesejadas de roedores. Após isto, com o seu carisma, personalidade e encanto, os gatos nunca mais saíram de nossas casas. Além disso, são animais que aparentemente se adaptam bem ao nosso ritmo de vida atual e, em particular, aos apartamentos.
MMM: Aparentemente?
DNS: Sim, aparentemente, porque ainda são animais algo incompreendidos e, apesar de poderem ser perfeitamente felizes estando só dentro de casa, temos de garantir os estímulos e a organização certa no seu território.
MMM: Portanto, as nossas casas passam a ser o reino e domínio do nosso gato.
DNS: Exatamente. E um dos recursos mais valiosos para um gato é o seu território e os odores que o caracterizam.

MMM: O que me leva à questão que nos trouxe aqui. Para os meus clientes que têm gatos e que vão mudar de casa, o que podem fazer para a transição ser a mais suave possível?
DNS: Em primeiro lugar, devem entender que quando mudam as coisas e móveis de sítio e quando começam a embalar os seus pertences, esta já é uma alteração à rotina que, em animais mais sensíveis, pode provocar ansiedade. É importante, logo aqui, começarem a notar se existem alterações ao comportamento do gato e falarem com o seu médico veterinário. Este pode sugerir soluções como, por exemplo, introdução de feromonas que ajudam os gatos na adaptação. Por sua vez, na casa nova é importante para os gatos manterem os mesmo objetos, com os odores familiares e de pertença, por isso os seus donos ou tutores devem levar os mesmos arranhadores, mantas, WC (e até com alguma areia antiga), taças de comida e água.
MMM: Desculpa-me interromper, mas podes explicar o que são e como introduzes as feromonas na adaptação do gato?
DNS: Neste caso, as feromonas de que falo são compostos sintéticos que são apenas detetados pelos gatos. Estes compostos imitam as feromonas libertadas pelos gatos quando dão “turras” ou arranham os objetos, assegurando-lhes a pertença e o território. Há várias formas de as introduzirmos no novo ambiente, nomeadamente através de difusores e sprays.
MMM: Então, na casa nova devemos instalar todas as coisas que o gato já conhece, é isso?
DNS: Sim, mas não basta. Já com a família e o gato na casa nova pode ser interessante, ao início, manter o gato (ou gatos) apenas numa divisão com todos os seus recursos, para que este possa voltar a sentir-se seguro. E, ao mesmo tempo, observar sinais de agressividade, isolamento ou outras manifestações de ansiedade, como eliminação inapropriada, ou seja, urina e/ou fezes fora do caixote.
MMM: Os primeiros dias numa casa nova também são sempre de alguma confusão, com arrumações necessárias e entrada e saída de pessoas estranhas, para as mudanças ou pequenas intervenções na casa. Algo de que os gatos não gostam muito...
DNS: Exatamente, daí que possa realmente ajudar mantê-lo numa divisão onde consiga estar isolado e protegido com todos os seus odores familiares.
MMM: E durante quanto tempo devem manter o isolamento?
DNS: É variável de gato para gato, mas quando identificarem sinais de conforto e calma podem dar acesso ao gato ao resto da casa, espalhar as suas coisas pela casa por forma a ter o seu odor familiar e deixá-lo explorar à vontade, com a curiosidade que bem o caracteriza. Podem ainda associar estes momentos a uma brincadeira ou comida que sabem que ele adora.
MMM: Comida que ele adora? Um petisco novo, por exemplo?
DNS: Não. Mais uma vez: os gatos são avessos à mudança. E nesta fase não devem mudar mais nada. Por isso é mais recomendado oferecerem-lhe os petiscos que ele já conhece.
MMM: E se mesmo com todos estes cuidados o gato continuar a mostrar sinais de inadaptação?
DNS: Bem… após um período de tempo de adaptação que lhes pareça razoável, devem falar com o médico veterinário e, com ele, perceber o que mais pode estar a interferir. Nomeadamente começar por perceber se foi feita uma adequada organização do espaço. Por exemplo: os gatos não gostam de ter comida e água próximas do caixote de areia.
MMM: Portanto, tentando resumir algumas das recomendações que aqui nos passaste: objetos e odores habituais na nova casa... adaptação faseada aos novos espaços... adequada organização do novo espaço… Há mais alguma coisa que seja importante?
DNS: Sim. Numa mudança de casa podem não ser apenas os espaços interiores a alterar-se na vida do seu gato, passando este a ter possibilidade de acesso a uma varanda, um terraço ou a um jardim, por exemplo. Se a nova casa dispuser de varanda ou terraço elevados, devem salvaguardar, da melhor forma possível, que o gato não acede a posições de elevado risco de queda. Atenção que as quedas de gatos de alturas elevadas são frequentes, graves e acontecem mais rapidamente do que imaginamos conseguir travar. Se a nova casa tiver um jardim e o gato passar a ter acesso ao exterior, com potencial contacto com outros gatos, devem falar com o médico veterinário pois há vacinação adicional a fazer para proteção de doenças transmissíveis entre gatos.
MMM: Muito bem. Parece-me que deixaste aqui algumas recomendações muito importantes para quem tem gatos e tenciona mudar de casa num futuro próximo. Da minha parte, a partir de hoje, terei um especial cuidado em aconselhar os meus clientes quando os estiver a ajudar numa mudança de casa. Daniela, quero agradecer-te pelo teu tempo e partilha de conhecimentos e experiência. Muito obrigado!
DNS: Obrigada eu, pela oportunidade desta partilha. Espero ajudar a compreender um bocadinho melhor estes animais tão complexos e, tantas vezes, incompreendidos. Tenho a certeza que, da tua parte, os teus clientes vão ter, pelo menos, uma chamada de atenção para este tema e os respetivos cuidados a ter.

Em jeito de conclusão deste artigo, e já fora do contexto desta conversa a dois, deixo aqui uma partilha que entendo dever fazer: partilho a minha vida com a Daniela há já 7 anos e com a Tocha, a nossa amiga felina, fofa e felpuda, há praticamente o mesmo tempo. Neste período de tempo conhecemos quatro casas diferentes e em todas essas mudanças de casa, a Daniela teve estes especiais cuidados com a Tocha. E funcionaram sempre muito bem!
Se necessitar de conselhos adicionais sobre esta temática e/ou se estiver a planear mudar de casa, não hesite em contactar-me:
Marco Moura Marques
+351 967035966
marcomouramarques@kwportugal.pt
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