No âmbito do trabalho que desenvolvo, enquanto consultor imobiliário, existem pessoas que trabalham longe da vista dos meus clientes, mas que estão na primeira linha dos meus verdadeiros parceiros de negócio. Estas são pessoas com quem aprendi e me mantenho a aprender muito sobre o negócio imobiliário e a mediação imobiliária. São as pessoas que dão um suporte fundamental à necessária segurança jurídica dos processos em que me envolvo, apoiando os meus clientes.
Para que possa melhor elucidar quem me lê sobre o trabalho e o valor acrescentado destas pessoas, convidei a Dr.ª Cristina Pinheiro para uma conversa sobre o seu papel e contributo para o meu negócio – consultoria em serviços e negócios imobiliários – enquanto responsável por um departamento processual numa empresa de mediação imobiliária.
Esta conversa teve lugar a 21 de setembro último. Longe de esgotar nesta conversa todas as temáticas relacionadas com um departamento processual, esta seguramente que será a primeira conversa… de muitas outras que partilharei oportunamente.

Marco Moura Marques: Cristina, em primeiro lugar, muito agradeço teres acedido a ter esta conversa comigo.
Cristina Pinheiro: Eu é que agradeço.
MMM: Já há algum tempo que eu, independentemente do objetivo que eu tenho agora, que se traduz na criação de artigos de relevância para a minha newsletter ou para divulgação nas minhas redes sociais, a verdade é que eu tinha alguns assuntos que gostava de desenvolver contigo numa conversa mais longa. Sei que hoje não vamos falar sobre tudo, mas seguramente que teremos oportunidade de abordar o restante noutra altura.
CP: Vamos deixar um rebuçado por desembrulhar…
MMM: Isso mesmo. Então, para começar, pergunto-te: quem é a Cristina Pinheiro e o que é que faz na Keller Williams?
CP: Ora bem… A Cristina Pinheiro é Solicitadora e presta serviços na KW Alfa. Deixando agora de falar na terceira pessoa… Sou licenciada em Solicitadoria e, neste momento, estou a completar a minha formação, tirando uma nova licenciatura, desta vez em Direito.
MMM: Porque?
CP: Porque acho que é uma mais valia, além de que continuar a estudar é sempre maravilhoso, em todos os aspetos.
MMM: Como é que chegaste aqui?
CP: Eu trabalho na área do Direito desde os 21 anos. Fui algo ‘empurrada’ para esta área, pois fui funcionária forense durante 12 anos, em escritórios de advogados. Tive a sorte de me ter sido dada a oportunidade de experimentar todos os ramos, tudo o que se pode fazer… Tive muita sorte. E isso fez com que, numa fase da minha vida em que não sabia bem o que queria, eu não tivesse que escolher a profissão, pois foi sim a profissão que me escolheu a mim. Apaixonei-me por ela e entendi que estava na hora de me tornar mais profissional e, então, decidi tirar a licenciatura. Um bocadinho tarde, é verdade, mas foi quando a vida permitiu.
MMM: Nunca é tarde para aprender… Eu vou voltar daqui a pouco a um lado teu, mais pessoal, mas agora, até para fazer a ponte com a questão seguinte, pergunto-te: o que é isto de “departamento processual de uma mediadora imobiliária”?
CP: O departamento processual de uma mediadora imobiliária é a parte da organização desta que dá todo o suporte ao processo de angariação, analisando toda a documentação relevante para verificação da segurança jurídica. E, se necessário for, também procede à obtenção de documentos. Cada documento está no seu sítio certo e, embora hoje as pessoas já estejam mais informadas do que há alguns anos atrás, muitas ainda têm dificuldades. E nós estamos aqui para ajudá-las, obtendo cadernetas prediais, certidões de registo predial, licenças de utilização…
MMM: E eu que o diga…
CP: É verdade.
MMM: Então deixa-me voltar atrás e perguntar-te: o que é que te motiva para estares à frente de um departamento processual?
CP: É uma ótima pergunta, Marco. Em primeiro lugar, tal como já referi, a minha paixão pelo Direito. Mas esta área de intervenção específica do departamento processual de uma mediadora imobiliária não incide apenas sobre a parte legal. Eu sou uma pessoa que necessita de se relacionar com outras pessoas. Gosto muito de falar com pessoas. Gosto de saber que faço parte de um projeto em que, através dos consultores, posso ajudar a deixar as pessoas felizes. Gosto de participar ativamente na vida das pessoas, até porque ‘comprar uma casa’ é O negócio da vida da maior parte das pessoas. E é muito satisfatório poder ver essa felicidade nelas e, dessa forma, alcançar essa sensação de dever cumprido. Neste projeto faço o que gosto, aplico o meu conhecimento, dá-me vontade de estudar ainda mais e, assim, ser ainda melhor profissional. Estou com pessoas, falo com pessoas, gosto de pessoas e de participar no projeto de vida delas.
MMM: Confirmo isso. És, sem dúvida, uma pessoa de pessoas e muito contribuis para aquilo que tu disseste: fazer felizes as pessoas à nossa volta. Estamos aqui também por uma vertente mais material, senão não conseguiríamos sobreviver, mas essa realização através da felicidade dos outros é algo significativo para todos nós. Percebo-te perfeitamente.
CP: Obrigada.
MMM: Olha… deixa-me então fazer mais uma ponte com a ideia de ‘fazer os outros felizes’. Eu diria que tu tens um cliente imediato, que são os consultores imobiliários. Os quais, por sua vez, têm os seus clientes, compradores e vendedores, senhorios e inquilinos. Certo? Estamos aqui a falar de dois ‘níveis’ de clientela. E a ambos tens que manter felizes.
CP: Sim, é verdade.
MMM: Deixa-me então perguntar-te: que valor podes dar aos meus clientes? Sendo eu consultor imobiliário e estando tu num departamento processual de uma mediadora imobiliária… Dentro daquilo que tu fazes, o que é que podes acrescentar aos meus clientes?
CP: Marco, em primeiro lugar, há um valor que acrescento ao consultor imobiliário, o qual o vai reverter sobre os seus clientes. Através das formações que eu dou aqui na KW Alfa, o consultor vai estar muito mais apto a dar respostas rápidas e certas às questões dos seus clientes. E se não estiver, sabe que eu estou à distância de um telefonema e de uma mensagem para eu lhe poder responder e ele, assim, poder prestar um serviço de excelência que é aquilo que se procura nos nossos consultores. Do ponto de vista dos clientes, eles podem ficar a saber que por detrás daquele consultor existe todo um suporte de pessoas habilitadas, o que lhes vai dar segurança e tranquilidade ao longo de todo o processo de um negócio que se quer fluido e tranquilo.
MMM: Vou agora colocar-te uma pequena rasteira, dizendo que este é um departamento processual, não é um departamento jurídico…
CP: É verdade.
MMM: Eu digo isto porque tenho alguns clientes com os quais tenho que ter um cuidado especial em sublinhar isso. Até porque eu próprio, por vezes, posso não ter sido muito claro quando lhes apresentei os meus serviços profissionais, deixando-os com a ideia de que trabalho com um departamento jurídico que os vai aconselhar juridicamente numa série de trâmites. Mas não é bem assim…
CP: Não, de todo. Estamos inseridos numa mediadora imobiliária e não num escritório de advogados ou solicitadores. A nossa experiência e conhecimento jurídico é fundamental, mas apenas damos suporte legal. Para obter toda a documentação que suporta uma angariação é necessário ter esse suporte legal. E é por isso que os departamentos processuais de todas as mediadoras imobiliárias estão munidos, assim o espero, de profissionais legalmente habilitados. De facto não prestamos apoio jurídico, mas podemos e devemos encaminhar as pessoas para os profissionais habilitados que as podem aconselhar.
MMM: Confesso-te que vou passar a ter mais cuidado nessa necessária clarificação junto dos meus clientes, até porque recentemente fui mal entendido por um deles e, num determinado momento do processo em que o apoiei, ele requisitou-me a mim e ao ‘meu departamento jurídico’ para, segundo ele, proferirmos uma opinião sobre um determinado problema de cariz jurídico. Percebi que foi uma falha minha, em termos de uma clarificação prévia dessa temática com ele. Mas assim o fiz e ficou tudo resolvido, tendo ele recorrido ao aconselhamento jurídico habilitado do seu advogado.
CP: Sim, acontece algumas vezes. É sempre fundamental que os clientes tenham esse aconselhamento junto dos seus próprios profissionais, advogados ou solicitadores. Até porque eles conseguem recorrer a profissionais e apresentar-lhes toda a documentação necessária para a resolução do problema. Documentação essa que, às vezes, não nos é entregue e/ou não recebemos a informação necessária para lhes dar o melhor aconselhamento.
MMM: Então, um departamento processual está intimamente ligado ao que é a atividade de um consultor imobiliário porque faz parte de uma mediadora. Então, em que fases deste trabalho do consultor junto dos seus clientes é que intervém mais frequentemente o departamento processual?

CP: Como já o disse anteriormente: a formação dada, a qual é essencial e importante. E esse conhecimento pode ser partilhado e adquirido ainda antes do processo de angariação. E, portanto, este é devidamente preparado, pelo que é uma mais valia ter esse suporte processual. Aquando da angariação, intervimos na validação de todos os documentos e sua atualização, pois tal é necessário para assegurar a segurança jurídica. Estamos perante negócio de elevada dimensão e é necessário validar todas as partes envolvidas, nomeadamente se, de facto, as pessoas são as proprietárias dos imóveis ou se há ainda alguns registos a efetuar. Dou-te um exemplo: o registo não é constitutivo do direito. Ora explicar isto, às vezes é difícil, porque a propriedade transmite-se por mero efeito do contrato. No entanto o registo serve para dar publicidade. E nem sempre as transações efetuadas (principalmente as mais antigas) estão registadas. É preciso encaminhar as pessoas para executar esses procedimentos e só um departamento processual profissional o pode fazer bem. Depois existem outras fases: a tão esperada fase do contrato de promessa de compra e venda, que é preciso minutar, o contrato de arrendamento… e depois a finalização deste sonho com a tão desejada escritura ou documento particular autenticado. Nesse contrato definitivo de compra e venda também é preciso assegurar que tudo decorra de forma fluida.
MMM: Certo. Agora para especificar algo que disseste e que tem a haver com o registo. O registo é, acima de tudo, para efeitos de publicidade do ato que é o contrato entre duas partes. Não existindo o registo, tal não torna ineficaz o ato. Mas, por exemplo, posso acompanhar um meu cliente-vendedor a uma escritura com documentos do imóvel a ser vendido onde o registo da compra do imóvel pelo meu cliente não foi efetuado e apresentar ao solicitador ou notário a evidência de que o contrato definitivo de compra e venda foi efetivamente efetuado e que, por esse facto, existe o meu cliente tem legitimidade para vender o imóvel, porque efetivamente o comprou. É possível?
CP: Sim, é possível, mas vai depender de algo. Por exemplo, o Sr. António comprou um imóvel e o mesmo fica devidamente registado em nome dele. No entanto, as pessoas que estão a vender o imóvel são os filhos do Sr. António, os seus herdeiros. E esse facto, o óbito e herança, não constam dos documentos legais do imóvel a ser vendido. Ou seja, a pessoa que consta dos registos legais do imóvel não são os efetivos vendedores do mesmo, no momento da escritura. No entanto, através de uma habilitação de herdeiros, os herdeiros do Sr. António estão habilitados para prosseguir com a venda efetiva do imóvel. A lei civil sobrepõe-se ao Código do Registo Predial. No entanto, existe um artigo do Código do Registo Predial que é o artigo 8ºA, na sua alínea iii, refere que não é obrigatório fazer esse registo intermédio, ou seja, registar a habilitação de herdeiros. Então, quando chegamos ao momento da escritura ou documento particular autenticado, perante o notário, advogado ou solicitador, podemos apresentar essa documentação para explicar a transferência dessa propriedade (usemos este termo para simplificar) e comprovar essa efetiva propriedade dos herdeiros.
MMM: Julgo que citaste um exemplo muito frequente.
CP: Sim, acontece muito. As pessoas podem registar a habilitação de herdeiros, mas estão a gastar dinheiro sem necessidade, pois no ato da efetiva venda podem usar essa prova documental.
MMM: Muitas vezes, nessas situações de heranças, as mesmas até se encontram registadas nas Finanças, por causa de obrigações fiscais como o IMI…
CP: Sim e porque é declarado o óbito às Finanças, conforme obrigação legal após óbito. A habilitação de herdeiros não é um documento obrigatório, mas para a efetiva venda torna-se obrigatório, sim.
MMM: Muito bem. Falaste há pouco de “escritura” e de “documento particular autenticado”... quais as semelhanças e quais as diferenças?
CP: Na prática, a validade jurídica é a mesma. A escritura pública é efetuada por um notário que é dotado de “fé pública”. No entanto, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 116 de 2018, foi-nos atribuído, aos advogados e solicitadores, as competências para a titulação de negócios jurídicos sobre imóveis. O princípio contratual é a liberdade de forma, exceto quando a lei obriga a forma especial. No contrato definitivo de compra e venda a lei obriga a forma especial, está consagrado no Código Civil: escritura pública ou documento particular autenticado. Por isso as escrituras são efetuadas pelos notários; já os solicitadores e os advogados produzem o DPA, ou seja, o documento particular autenticado.
MMM: Em termos de eficácia e segurança jurídica, é a mesma coisa?
CP: É exatamente igual. Apenas o procedimento é diferente. Como o nome indica, é um contrato que vai ser sujeito a termo de autenticação pelo profissional habilitado. O nosso documento particular autenticado, para a inteira validade do ato, é depositado até à meia-noite do próprio dia em que é elaborado.
MMM: Há algum tipo de transação imobiliária que obriga a escritura e não a DPA ou estamos livres de optar por um ou outro?
CP: No negócio imobiliário não há nenhuma obrigação a este nível. Na produção de uma habilitação de herdeiros, esta tem de ser efetuada por escritura pública, porque circunscreve a validade das declarações do cabeça de casal, que têm de ser prestadas perante um agente que tenha fé pública. Ou seja, não está exclusivamente ligada ao negócio imobiliário, mas muitas vezes acaba por se ligar, pois é uma fase que pode ser necessária.
MMM: Dentro da tua atividade num departamento processual, onde identificas a área de maior risco? Onde é que tens de estar super atenta e onde é que a história te diz que é “aqui” que acontecem os maiores problemas?
CP: Ora bem, temos várias situações… Temos de analisar os documentos com atenção, temos de verificar se, de facto, o imóvel está registado em nome daquela pessoa, que é o mais fácil. Mas, se não estiver (e pode não estar pelo que já falámos anteriormente), temos de verificar se existe um título que habilite essa pessoa a poder vender, senão corremos o risco de estar a ajudar essa pessoa a vender bens alheios e não é isso que se pretende. Verificamos também a necessária harmonização de áreas, entre os vários registos do imóvel, o que é especialmente importante em moradias. Verificamos as licenças de utilização, a sua existência e a sua data de emissão, pois, muitas vezes, os imóveis são anteriores a 1951, o ano de entrada do regulamento que as exige; mas mesmo assim é necessário solicitar um comprovativo desta situação, ainda que a caderneta predial possa indicar que o imóvel é anterior àquele ano ou mencione um averbamento que o refira também…
MMM: Já me alertaste para isso.
CP: Exatamente! Poderá ser necessária uma certidão camarária, não bastando a inscrição na matriz. Dessa forma não corrermos o risco de existir uma certidão camarária que indique que a edificação foi efetuada antes da entrada em vigor do regulamento - anterior a 1951 - mas que foram verificadas na mesma edificações sujeitas a licenciamento e que não existiam na cartografia anterior. E isso, pelo menos para já, é um impedimento.
MMM: Muito bem. Um pormenor que partilho: eu deparei-me com uma situação, julgo que em Santo Tirso, em que um imóvel era posterior a 1951 mas anterior a 1960 e tal, tendo eu chegado à conclusão de que nesse conselho e em mais conselhos…
CP: É verdade, este Decreto-Lei de que falo é o 38382/51 de 7 de agosto, mas ele não entrou em vigor na mesma altura em todos os municípios. E, por isso, é natural que existam diferentes datas para validação da existência de licença de utilização. Tal já me aconteceu e, por isso, é sempre preferível e mais seguro solicitar a certidão camarária que dará maior segurança a todas as partes.
MMM: Ainda em relação aos maiores riscos que passam pelo teu departamento processual… Já passei por algumas situações de dúvida, quer em mim, quer nos meus clientes, e que tem que ver com os ‘autorizantes’. Algumas vezes deparo-me com situações em que o vendedor alega que comprou ou herdou o imóvel em data anterior ao seu casamento atual…
CP: Sim, percebo. É, por vezes, muito difícil explicar situações em que as pessoas compraram o imóvel quando eram solteiras e, entretanto, casaram e alegam que o cônjuge não tem que se pronunciar com a venda de algo que é só seu… Pode ser muito difícil. Mas podemos simplificar: se as pessoas casarem em comunhão geral de bens, os bens que levam para o casamento e aqueles que adquirem após o casamento, é de ambos e tudo é simples. Na comunhão de adquiridos, os cônjuges conservam os bens próprios (os que levaram para o casamento) e as suas heranças e o que adquirem após o casamento, isso sim, é dos dois. Na separação de bens entre um casal com comunhão geral ou de adquiridos, ambos sabem o que é de um e o que é do outro e sabem o que é dos dois. Aí a situação é clara. No entanto, existe uma exceção: a nuance da ‘casa de morada de família’, em que existe uma proteção da lei em relação à outra parte. Ou seja, ainda que o imóvel possa ser apenas de um deles, se esse imóvel for considerado ‘casa de família’ do outro, então este terá de autorizar a venda do mesmo. Consentimento este que é diferente do que ocorre na comunhão de bens: na comunhão geral de bens, ambos são proprietários; na comunhão de bens adquiridos, o cônjuge tem de dar o seu consentimento conjugal. Já na separação de bens, só tem de o fazer se o imóvel a vender for a morada de família, e isto é assim para proteção do cônjuge.
MMM: E no caso de uma empresa detentora de um imóvel que quer vender esse imóvel, quem são os autorizantes? Quais os cuidados a ter para ficar válida a operação e quais as assinaturas necessárias?
CP: Muito boa pergunta e que é uma pergunta chave. Dou sempre o exemplo da empresa XPTO que tem no seu objeto social a compra e venda de vestuário, tem 2 sócios e até tem na pessoa do gerente uma outra pessoa diferente dos sócios. Quem é que pode vender o imóvel da sociedade? Ora, poderia ser o gerente, mas apenas se no objeto social constasse compra e venda de imóveis, caso contrário terão de ser os sócios. Há várias questões aqui a analisar e, por isso, é que o departamento processual é importante. Vai avaliar qual o objeto da sociedade, verificar se, eventualmente, existe uma ata de deliberação da sociedade… Ou seja, este é um tipo de ‘pormenores’ que podem passar à margem de alguém... mais leigo, digamos assim.
MMM: Ainda nesse último exemplo, imagina uma sociedade anónima com conselho de administração, em que o presidente tem poderes para assinar sozinho. No entanto, o objeto social da empresa não tem que ver com transações de imóveis. Portanto, para assinar o CMI e, posteriormente, a escritura ou DPA, vai ser necessária de uma ata de deliberação do conselho de administração, certo?
CP: Sim, senhor.
MMM: Muito bem, entrando agora noutra temática. Como sabes, recentemente foi promulgada pelo Presidente da República uma proposta de Lei da Assembleia da República, ao abrigo do pacote ‘Mais Habitação’. Esta proposta visa implementar uma espécie de ‘simplex’ ao nível do urbanismo e naquilo que toca diretamente com a nossa atividade, aborda a simplificação de formalidades nas transações de compra e venda de imóveis. O que nos podes dizer sobre isto?
CP: Ora bem, esse pacote vai dar ‘pano para mangas’ em muitas conversas... Esta Lei que foi aprovada - a 50/2023 - do que já estive a analisar, talvez seja a menos controversa, apesar de também introduzir alguma controvérsia. Prometeram vários ‘simplex’ ao longo dos anos. Mas a intenção desta Lei é desburocratizar e também responder aos problemas reais da habitação, aumentar o parque imobiliário, etc… Estou convicta de que a intenção é essa. Eu quero crer que está a ser assegurada toda a necessária segurança jurídica para tornar efetiva essa Lei. Do que já li, que não foi tudo, sei que a Lei entrou em vigor e que foram dados 180 dias para se proceder às alterações de vários diplomas, sendo o RGEU (Regime Geral das Edificações Urbanas) um deles. No que nos diz respeito, na mediação imobiliária, acho que essa vai ser a alteração com maior impacto. De facto, vai ser eliminada a obrigatoriedade de apresentação de ficha técnica de habitação, bem como de licença de utilização, ainda que a entidade autenticadora a isso tenha que fazer referência no título. E isso é capaz de ajudar, em primeiro lugar, aqueles processos em que, por falta de licença de utilização, os imóveis permanecem ‘parados’, não utilizados, não transacionados. No meio deste processo tão burocrático, estes pedidos de licença de utilização obedecem a uma série de requisitos burocráticos, com todos os prazos adjacentes, os quais nem sempre eram cumpridos para desespero de proprietários, vendedores e compradores.
MMM: Falaste em algo que preciso de clarificar, para facilitar a vida de quem nos vai ler: o que é a ‘autoridade autenticadora’?
CP: Notário, advogado ou solicitador.
MMM: Ah... ou seja, o que estás a dizer é que na escritura ou DPA, ainda que aquele imóvel não apresente uma licença de utilização, e também nas transações em que era também exigida uma ficha técnica de habitação, com esta nova Lei pode apenas ficar mencionado e registado que não foram apresentados estes documentos, mas ficando a transação devidamente formalizada com esta menção?
CP: É esse o objetivo. Mas não de forma tão simples, porque depois temos de diferenciar se a obra foi sujeita a controlo prévio ou não, se os prazos foram cumpridos e por culpa de quem é que não foram. Estamos a tentar desburocratizar mas acho que se calhar vai ter maior impacto na construção nova. Acho que no imobiliário usado talvez não tenha assim tanto. Vamos ter de esperar para ver o efeito em cada um destes regulamentos, sendo certo que acredito que o espírito seja mesmo desburocratizar e deixarmos de ter tanta gente sem casa e tanta casa sem gente!
MMM: Certo. Então, até mais ou menos março...
CP: Até 28 de fevereiro de 2024, se não estou em erro, estes diplomas serão alterados. E, espero eu, que não sejam prorrogados os prazos.
MMM: E aí nos darás as novas explicações e atualizações.
CP: Darei sim, uma por uma!
MMM: Cristina, tenho algumas outras temáticas que não cabem nesta conversa, mas que ficarão para outras, uma vez que são temáticas mais específicas. Tens algo que queiras acrescentar agora?
CP: Quero-te agradecer muito a conversa, gostei muito de participar. Tenho muitos contratos para fazer e muitas angariações para analisar, mas entendo que é importante falar sobre isto. As pessoas estão, hoje em dia, muito mais informadas do que há alguns anos, mas falta sempre qualquer coisa e se acompanharem as tuas redes sociais ficarão mais elucidadas. E pode ser que já não ouçamos tantas vezes a resposta “para que é que me está a pedir disto, nunca ninguém me pediu isto”.
MMM: Muito obrigado e até breve!
CP: Obrigada!

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Marco Moura Marques
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